Uma fábula sobre o mínimo monumental
Difícil encontrar alguém que, lá na frente, enxergue a vida como um papel em branco. Até mesmo quando a memória apaga, a história fica. E embora a tinta possa ser aguada e fraca para alguns, para outros, parece, sobram cores, coragem e inspiração. Entre esses que incorporam esse talento para transformar um tico de nada, um cisco que seja em puro encanto e, assim, preencher todos os cantos do tal papel até que ele não suporte e transborde ( para nossa sorte!), está Willi de Carvalho. Não é de agora, nem de ontem, nem foi de estalo. Quando menino, parecia que a coisa já era sina. No quintal de casa, ele inventava o brinquedo que não tinha. Criava um mínimo monumental, ao dar vida própria a um palito, um grampo de cabelo, que incorporavam pequenas fábulas. É que o menino já gostava de detalhes, que o olhar escrutinava com zelo. Era assim que, de uma hora pra outra, todo tipo de objeto que estivesse ao alcance da mão e da imaginação ganhava um mundo novo. Os materiais utilizados por Willi fazem parte de um mundo concreto, mas a criatividade – esse algo impalpável que vem de toda parte – sempre foi alimentada pela música, pela literatura, por viagens e por o que quer que seja que o olhar possa alcançar.
Um dia, o artista curitibano Hélio Leites viu uma maquete do menino e ficou tão impressionado que o incentivou a continuar criando objetos em miniaturas, mais precisamente em caixas de fósforo e materiais reciclados. A partir de então, as miniaturas passaram a ser sua especialidade. Graças a elas, hoje Willi é reconhecido por colecionadores, marchands e donos de importantes galerias brasileiras.
Tema recorrente em sua obra, as festas populares, em especial as mineiras, contam um pouco da vida de Willi, natural de Montes Claros, cidade do norte de Minas Gerais. Festas religiosas e profanas, catopés, caboclinhos, marujada, reinado e congada fazem parte de grande parte de seu trabalho. Símbolos como o estandarte, peça importante nesse tipo de festa, e os espirais, que representam a presença barroca das cidades históricas mineiras também tem forte presença em suas peças.
Para ele, a intenção é lembrar Minas e não copiar a cidade. Coisa da imaginação mesmo. Também deve ser coisa da imaginação essa curiosa tarefa de encaixar tanta grandiosidade em tão pouco espaço. Uma vez, em uma entrevista para a televisão ele disse mais ou menos assim: “Eu imagino alguma coisa, um desenho no ar. Como se fosse uma orquestra, vou orquestrando uma ideia. Passo tudo para o papel, anoto tudo o que quero. Só depois faço a peça. Mas nunca fica igual ao que pensei lá no começo. Ou eu tiro, ou acrescento alguma coisa.” Willi, será que nós podemos pedir uma coisa¿ Continue imaginando, continue vendo desenhos no ar, anotando, tirando e acrescentando o que quiser. É que a folha da nossa vida ganha esse tanto de fábula quando nos deparamos com uma obra sua. Numa hora dessas temos a certeza de que, quando a arte está presente, ela encosta bem no meio da nossa eternidade.